Desde que você se foi, eu ando perdida.


Havia dias em que eu queria esquecer e outros em que eu me acabava nas lembranças; havia dias que os dias passam devagar, e outros que a lentidão não me deixava sair do lugar. O tempo não mudou minhas reações, minha raiva ou meu amor. O último era o pior: se esvaía com a mesma frequência em que voltava para o meu coração. Sempre num ritmo que nunca parava, não se cansava, sempre me tirando o que restava de mim. Aquela fé de que tudo um dia pudesse mudar, que um dia todos meus sentimentos iriam parar de se mostrar em uma canção de amor, foi se esgotando. Então eles passaram de"uma canção" para "várias canções" - todas lentas, com letras e palavras lentas, acompanhando meu pensamento lento. Tudo se encaixava, menos eu no final. Eu precisava me salvar, mas nada tinha uma razão. E se não fosse pela razão, que fosse pelo coração, que não estava inteiro, mas ainda sobrevivia com suas metades e lembranças partidas.



When everything feels like the movies
You bleed just to know you're alive...

A verdade é que é tudo mentira.

Eu costumo esconder a verdade.

Eu sei que é mentir, mas não que isso seja tão ruim assim. Mentiras muitas vezes contadas, se tornam verdades. Então, porque não mentir? Mentir até cair na sua própria armadilha, se iludir com algo que pode ser bem melhor do que a realidade? Olhar pra trás e ver que sua vida não foi tão ruim, quando na verdade, por debaixo daquelas imagens do passado, coladas com super-cola, não havia nada? Mentir com o intuito de se sentir melhor, de esquecer, de se curar, viver. Viver em uma vida que não foi sua, na história que você quiser criar, não me parece tão má ideia assim. Contar histórias magníficas, mudar de alma, ser alguém diferente todo dia; privar as pessoas das suas verdades tediosas, dos seus problemas dolorosos, abrir a boca pra sorrir ao invés de jogar os problemas nos ombros e ter que conviver com uma escoliose emocional. Se todo mundo mentisse e mudasse seus papéis na história da vida, todo dia, a verdade seria a vilã, a maldita que persegue todos com suas sete cabeças e suas dentaduras afiadas. Para mim, é como a verdade é: ninguém gosta muito de saber da realidade; ninguém quer saber se está realmente bonito quando perguntam "essa roupa ficou boa em mim?". As pessoas querem ser bonitas, mesmo quando não são, querem ser ricas, mesmo quando não podem, querem a mentira para completar a felicidade.

Então, porque não mentir para se sentir mais feliz?
"Há dois momentos, Carolina, em que o amor é mais do que uma paixão, é uma loucura: É o momento em que se possui ou aquele em que se perde o objeto que se ama."

José de Alencar - A Viuvinha

Eu não entendo a sua volta.

Talvez eu não sentisse nada.

Eu não sabia se podia classificar dúvida como um sentimento, e naquele momento, era só o que eu tinha reconhecido. Eu não entendia nada das palavras que pairavam no ar. Separei-as, coloquei-as em uma ordem diferente, tentei lê-las de trás pra frente, mas continuava sem fazer sentido. Eu não entendia a sua volta, sua indecisão, suas palavras, suas mãos geladas, seu olhar culpado. Eu não entendia o que eu estava fazendo ali, te olhando com cara de... dúvida.
Comecei a pensar que quando você se calasse, seria minha vez de falar alguma coisa - qualquer coisa, só pra não te deixar ali, se sentindo sozinho, sentindo o vazio de alguém que tinha ficado para trás por decisão própria. Reli nossa história na minha cabeça, encaixei as palavras em alguns momentos e as coisas começaram a ficar mais claras. E então eu, finalmente, senti alguma coisa, uma coisa que fervia dentro de mim, sussurrando baixinho para os meus miolos: surre-o. Machuque-o assim como ele fez com você. E quando eu pensei nessa possibilidade, de te agredir fisicamente, ou psicologicamente, hesitei. Hesitei como as pessoas apaixonadas hesitam, aquelas que tem vontade de atirar em alguém, mas na mesma hora, pular na frente da bala.
Não era justo, você parecia um vício que largar era quase impossível. E quando eu me considerava limpa, vinha você pra me oferecer mais? Não aguentava mais aquela história de um dia ser seu grande amor, mas no outro dia não e resolvi acabar com tudo, naquele momento, com você na porta da minha casa, segurando as minhas mãos e balbuciando "perdão", "me desculpe", "eu sou um idiota" e "eu te amo" de um jeito particularmente adorável. Enquanto eu tentava vida nova, você veio pra perguntar se tudo o que eu sentia acabou.
Minha resposta foi: "Não. Mas eu quero que acabe".

Como uma tecnologia muito avançada, eu silenciei. Esqueci que para ter novas palavras preciso gastar todas as antigas, ou paro. Preciso ler ...