Eu ando dando mais nós que desatando, sofrendo mais do que vivendo, pensando mais do que realizando. Não consigo mais ter palavra própria, sobrevivo de provérbios e não vejo o bom no maravilhoso. Não vejo o ruim no péssimo também. Não vejo nada. Ando presa nessa jaula de carne e osso, mas ela parece tão vazia quanto... tão vazia quanto ela realmente é. Não há alma aqui. E caso houver, é uma alma que há muito dorme, se não já anda morta.
Vi suas fotos e quase não acreditei que fosse o mesmo. Ali você sorria, e permaneceu assim na minha memória: A felicidade gritava nos seus olhos. Ninguém poderia saber, a não ser quem cometeu o crime de ferir sua alma, que você sangrava. Não, nunca ficou claro o suficiente pra ninguém o quanto você estava destruído por dentro. Estava perdido, eu aposto. Navegando um barco quebrado, com as velas rasgadas, no mar da tristeza que eram seus pensamentos. Só sei disso porque me sinto assim agora. Me sinto assim como você, quando resolveu ir embora e estancar essa ferida. Estancar todas as lágrimas que corriam por dentro e escorriam para fora, que quase te afogaram. Você tomou uma decisão, virou as costas e resolveu que nunca voltaria. Mas eu.. Continuo aqui, dando voltas no precipício.

Eu sinto muito.
Veja bem: é que os tempos mudaram muito mais rápido do que eu aguentava. Foi numa dessas voltas estilo "fast and furious" do relógio que eu desequilibrei do ponteiro e caí. Fiquei pendurada com uma das mãos, clamando por uma ajuda. Mas ninguém conseguiu parar a máquina, ninguém se arriscou ali, naquele abismo de tempo no meio do espaço, pra me salvar. Nem bombeiro com cama elástica, me esperando lá embaixo. Não aconteceu nada. E depois de tantas horas tentando voltar pra posição inicial - aquela segura, onde meus dois pés ainda estavam equilibrados -, e vendo a falta de esforço geral, eu desisti. Não iria nunca conseguir sozinha. Soltei e deixei me levar pela gravidade. É assim que eu me encontro: indo de encontro ao chão.


(Será que ele me pagaria um drink? Preciso de uma bebida.)
E tem uma hora que você para e vê que vive uma vida que não é sua há muito. Não porque outro alguém esteja vivendo por você; pelo contrário, é uma vida de ninguém. É um corpo vagando pelo nada, por aqui, sem saber o que fazer. Você já está morto e suas cinzas estão no fundo do poço. É isso que você é: um monte de osso e carne podres, sendo mandado e desmandado por outras carnes tão mais podres e ossos tão mais fraturados do que os seus restos...
Gosto de você um pouquinho. Mas só um pouquinho - o bastante pra me fazer pensar em você antes de dormir. O bastante para imaginar um passeio longo de mãos dadas, um piquenique naquele parque florestal próximo da minha casa. Poderíamos ser próximos como o parque e a minha casa, não poderíamos? Se quiséssemos. Mas parece que não é bem assim. Ah, se as coisas fossem mais fáceis! Se o meu medo de me arriscar e me perder nesses teus braços e carnes não fosse não grande. Se não fosse eu.. Tão boba. Tão infantil. Tão sonhadora. Mas ainda sim, tão sua... (mas só um pouquinho.)
Justificar me cansa. E eu não quero mais ser castigada por essas correntes de ferro enferrujado que se enroscaram nos meus pés, e me deixam presa aqui. Vago agora pelo nosso amor como um fantasma velho de alguém que já foi feliz: pálida semelhança. Dolorida semelhança. Não gosto de ficar assim, nessa situação de sobrevivência; não dá espaço pra respirar, sorrir. Já desejei, um tempo antes, a melhoria, mas minha esperança acabou depois de teimar tanto. Vou parar de me repetir, vou me libertar das algemas dos porquês, suspirar aliviada e um tanto triste também. Não existem "condições favoráveis" para o que é verdadeiro. Mas não existe sinônimo de verdadeiro com significado "eterno". Não no meu vocabulário.

 é agora viu é agora você vai ter que escolher e dar esse passo gigantesco que é o futuro se afunilando e abrindo ao mesmo tempo mas o mal e...